A(R)RISCO INTRA-MUROS – por Renata Azambuja
Em alguns momentos podem parecer escritos, mas não chegam a articular a linguagem como textos, e sim como figuras, onde a linha e a cor são potência (no sentido aristotélico do termo). As linhas, que estão presentes nos trabalhos de Rodrigo Paglieri, Marta Mencarini e Tiago Botelho permanecem mais como escrituras de ver. Os artistas traçam e desenham em caracteres, ideograficamente, organicamente, e nessa maneira pessoal de agir com a linha, vão configurando e articulando diferenças visuais.
Essas diferenças se manifestam na medida em que as linhas, transformadas em desenho, são delineadas sobre as paredes en-tornando e ex-tornando movimentos que buscam o interior, emergem, sobem, e permitem tempo ao espaço, que é muro, que é da pintura, que é do estêncil.O tempo de urgência de comunicar pela forma-signo-figura, em Rodrigo; o tempo de exteriorização embrionária e psicodélica, de Marta; o tempo de estruturação interna e sensível da forma, de Tiago.
Há uma prática que investiga, incessantemente, um lugar para se materializar, atendendo aos desenhos (desígnios) que se configuram na relação entre espaços: o que se refere a sua materialidade/exterioridade e o que alude ao topos mental. Na intercessão, produz-se um deslocamento que permite o vão da linha e o sim do vazio, que pode adquirir colorido ou não. Há um fluxo. Para os artistas, uma ex-tensão, posto que, diferir pode ser dilatar. Propõem o flerte com o ritmo estrutural proposto de um a outro sem perder a própria cadência e pulsação. A conversa entre os artistas que se dá intra-muros versa sobre instâncias do mundo, territórios onde habitam figuras e pensamentos, simulações do real que o desenho assombra e incorpora.
O desenho e a pintura acionam experiências visuais que se estendem de um signo plástico a outro: No trabalho de Marta Mencarini, nos deparamos com movimentos intermitentes e revolutos de linhas pouco espessas que descobrem manchas – generosas porções de cor – que parecem se aquietar, por um instante, ao encontrar o padrão geométrico que o estêncil indica, mas continuam viagem contínua por figuras reconhecíveis do mundo natural e artificial.
Essas sensações visuais que a simultaneidade das formas proporciona, tomam um outro sentido no trabalho de Tiago Botelho, que encapsula silhuetas mutantes, em uma espécie de sistema de organização linear, princípio do vir a ser e, ao mesmo tempo, reminiscência do que já foi a figura antes do ato de apropriação, mas que, agora, sob o valor de signo gráfico, se torna novamente matéria básica, infinita, plena de possibilidades. Figuras prontas para estabelecer novos pontos de ligação, à maneira de sinapses, como o próprio artista aponta, e que a linha faz comunicar.
Transformada em sinais, Rodrigo Paglieri faz a linha ganhar um espessamento que se transporta do estético para o ético, ao incorporar figuras – imagens e textos – que nos conduzem ao exterior, e que a prática com o estêncil imprime e confirma, reforçada pela assimilação de nacos da rua – cartazes decalcados – apropriação de resquícios que o urbano dispõe e que o artista toma e leva para o espaço expositivo, transformando em instalação o desenho que a cidade plasmou.
Movimentos que a(r)riscam sentidos para imagens, que não são escritos, como textos, mas como desenhos.